A Ignorância tem um lugar na Sabedoria

Afonso Rocha Pereira

1/28/20222 min read

Há quem diga, desde há séculos, e de uma forma quase nostálgica, que a “ignorância é uma bênção”. John Lennon disse-o e mais recentemente também Kendrick Lamar numa das suas músicas. Uma frase não idêntica, mas que também se assemelha ao conceito de Fernando Pessoa sobre a dor de pensar.

Talvez quem o diga, (por vezes) assim o preferisse.

Não saber, o que hoje já sabe.

Mas só o consegue dizer, quem já sabe o que não queria saber. O que torna a frase quase uma hipocrisia perante a sabedoria. Como se a sabedoria fosse contrária ao bem-estar. Como se também não disséssemos tantas vezes “Ah, se eu soubesse…”.

Por um lado, saber aquilo que nos magoa, dói. Por outro, a nostalgia com que muitas vezes essa frase é dita, também faz entender que é na Verdade que a saúde se ancora. E, por mais que nos doa, também é na dor que aprendemos as coordenadas que queremos ou não seguir nos nossos caminhos. A dor de saber torna um “Ah seu eu soubesse…” num “De aqui em diante já sei!”.

Quando o dizemos, que a “ignorância é uma bênção”, percebemos que não saber o que porventura gostaríamos de esquecer, seria como mentir-nos a nós próprios e, que por mais que imaginássemos que uma vida sem dor pudesse ser paradisíaca, intuímos bem, que embora seja bom sair da atmosfera, melhor é construir os nossos sonhos com um pé dentro e outro fora dela.

A ignorância não é uma bênção, já ignorar o que não nos importa é uma outra história. Que aliás, remonta-nos à frase original de Thomas Gray em 1768 no seu poema Ode on a Distant Prospect of Eton College” que diz “Onde a ignorância é uma bênção, é uma loucura ser-se sábio”, o que tem um significado completamente diferente de “a ignorância é uma bênção”. Não se trata de um ataque ou de uma desvalorização da sabedoria, mas de um saber distinguir o que nos importa e o que não nos vale a pena.

Talvez fumar um cigarro sabendo o mal que nos faz, nos traga alguma culpabilidade, algum mau estar, mas Liberdade é poder escolher. E sem liberdade não poderíamos escolher entre o prazer de fumar um cigarro e o prazer de manter o nosso sistema respiratório “limpo”. A Ignorância tem o seu lugar na Sabedoria, porque a ignorância é uma bênção, mas apenas quando queremos disfrutar do prazer de fumar um cigarro. Ou, do prazer de dançar sem saber dançar e não ligar para o gozo a que seremos carinhosamente sujeitos por todos os nossos amigos.