O que é a depressão?

Afonso Rocha Pereira

6/15/20220 min read

É isso.

Um nada.

Um vazio no existir.

É um luto inacabado de um passado insatisfeito.

É um luto suspenso que se prende e arrasta o passado ao tempo presente e futuro, porque sem um luto, o “objeto” perdido permanece vivo, eternizado estaticamente, que faz sobrar a nostalgia que vai consumindo o que existe à sua volta.

São demasiados dias na ausência da criação.

É hibernar o presente.

É personificar-se numa culpa sem desculpa.

É a repetição do passado por teimosia de uma saudade que aprisiona.

É uma perda desvalorizante e culposa.

É sentir, por vezes sem o saber, mal-amado/a.

É estar vivo sem ser vida.

Será interessante distinguir a “depressão clássica” da “depressão sem depressão”:

Depressão clássica:

É uma laranjeira que não brota laranjas.

É olhar num só sentido.

É desistir por não tentar para evitar a depressão.

É um estado de abatimento quase sempre.

É sentir-se mal-amado, e crer que deve a não saber amar.

É ser noite o dia todo.

A depressão sem depressão:

É uma laranjeira que cresceu a fertilizantes químicos e que por isso vai degradando o seu solo.

É ver sem olhar.

É ceder eminentemente à “loucura da censura”.

É uma insatisfação latente eternizada pela relatividade.

É nunca desistir para evitar a depressão.

É não poder deprimir.

É sentir-se mal-amado sem o saber.

É ser dia o dia todo.

E podemos ainda distinguir a depressão psicótica:

É uma dor sem nome enquistada no peito. Aterrorizante.

É uma falta incompreensível e intolerável.

É a intelectualização da vida por não ter condições de a sentir.

É um buraco no Eu por falta de um “objeto” interno suficientemente securizante e coerente. Por falta de amor.

É estar só, dentro de si.