O que é conhecer alguém?

Será como Paulo Gonzo nos disse? Saber de cor?

Afonso Rocha Pereira

1/8/20222 min read

Se fizermos o exercício mental de pensar quantas pessoas conhecemos, podemos criar uma lista extensa dessas pessoas, ou até contá-las pelos dedos, mas facilmente nos deparamos com a pergunta, “Mas afinal o que é conhecer verdadeiramente alguém?”.

Comecemos pelas caraterísticas físicas. As caraterísticas físicas dão-nos sempre um ponto de partida quando tentamos compreender alguém, mas por mais pistas que nos deem, quando pensamos em conhecer alguém, pensamos essencialmente por dentro, isto é, pensamos como é que é aquela pessoa, como é que ela pensa, como é que ela se sente e nos faz sentir, como é que ela se comporta nas várias situações da vida e por aí adiante. É claro que o físico nos permite pensar o interior, mas analisar apenas o físico seria limitador, visto que cada pessoa é um Mundo diferente.

Portanto conhecer alguém implica fundamentalmente: conhecer o seu interior.

Quando pensamos em conhecer o interior de alguém, pensamos em conhecer as suas partes mais íntimas, as suas glórias, as suas fragilidades, os seus limites, as suas defesas, as pessoas de quem gosta e quem gosta de si, o que gosta e não gosta de fazer, se prefere um sumo de laranja ao pequeno-almoço com o sol das 10 da manhã, ou se prefere um jantar tardio com uma garrafa de vinho, ou até ambos.

Dou por mim a pensar que conhecer alguém por inteiro, ou como o diria Paulo Gonzo, saber alguém de cor, será pelo menos quase impossível, mas se formos razoáveis, não precisamos de conhecer tudo “tim tim por tim tim” de uma pessoa para sentir e saber que a conhecemos.

Conhecer deriva da palavra “cognoscere” que se trata do acto de ser capaz de entender.

Mas… conhecer alguém não se pode limitar ao entendimento dessa pessoa.

Isto é, a vida é movimento, como nós. Se por exemplo, o nosso coração parar de bater, morremos. Ao querer conhecer alguém, seria apenas insensato presumir que já a conhecemos por inteiro, já que a própria personalidade é dinâmica, está sujeita a transformações, ao movimento.

Conhecer é ser capaz de entender, mas essa capacidade de entendimento também tem como pressuposto a habilidade de sermos capazes de aceitar a dúvida e o desentendimento do Outro, porque é apenas nessa condição que as pessoas que queremos conhecer se dão à liberdade de serem conhecidas e nós de as conhecermos todos os dias mais um bocadinho. Se pensarmos até na física, sabemos que uma partícula modifica o seu comportamento quando é observada, pelo que, lamento Paulo, conhecer cada sombra do olhar do Outro é romântico, mas o desconhecido é infinito e ainda bem.

Portanto, conhecer alguém é mais que entender, é sentir essa pessoa na relação intersubjetiva que estabelecemos com ela. Mesmo que as memórias nos digam ao ouvido quem ela é, também é necessário um desprendimento da memória, para dar lugar a um sentir e saber em conjunto, a um sonhar e a um criar de novas dimensões daquilo que somos. Um desbravar o ainda desconhecido.

Conhecer alguém é mais do que a conhecer, é também conhecermo-nos a nós mesmos e mais: é sermos capazes de amá-la e a nós, porque é esse amor, que permite, mesmo com a dúvida, ou com a certeza de que nunca poderemos conhecer alguém por inteiro (nem mesmo a nós próprios), dizer: “Sei-te de cor”.