O "meu" Alberto Caeiro à briga com o "meu" Ricardo Reis

Afonso Rocha Pereira

6/15/20221 min read

Divide-me pensar poder ter tudo.

Essencialmente poder ser tudo.

Fundamentalmente o poder.

É uma receita que dura apenas até que o meu Alberto Caeiro se cruze com o meu Ricardo Reis.

O problema não é tanto que se cruzem e andem à bulha, mas que depois da bulha não se acordem entre eles.

Preocupa-me que se mantenham assim, cada um para seu lado, como se, sem um consenso pudessem ambos ter a sua vida própria.

Poderia ser verdade, se eu tivesse dois corpos como parece que tenho almas.

No entanto, as células do meu corpo teimam em não se multiplicar e materializar-se num outro corpo. Já tentei todos os tratamentos, primeiro tentei evitar que brigassem, mas ao não brigarem um com o outro, ao invés de serem naturalmente agressivos tornavam-se violentos, e ainda, faziam de mim pombo correio.

Já tentei descosê-los como se fossem siameses, mas eles eram mais “ciumeses”.

Numa fúria compulsiva, amordacei-os aos dois - aí viraram-se ambos contra mim.

Tentei reservar praias e bares diferentes para cada um, quis até conquistar uma mulher para cada um, mas… sempre por azar (claro!) misturavam-se sempre histórias e pessoas das praias e bares um do outro. Duas dessas pessoas eram as suas mulheres, que, como se fosse culpa minha, esbofetearam-me a cara chamando-me nomes aos quais ainda hoje me faço desentendido, o mais comum era “cabrão”.

Enfim, quanto mais os tentei agradar a ambos, mais me desvinculava do meu mundo e das minhas histórias. Pensei ainda em encontrar uma mulher que agradasse a ambos, mas, “vaidosos”, não suportavam dividir tal beldade.

E bem, então que se “f****”. Afinal, quem manda aqui sou eu.

Não posso ser nem ter tudo, aliás nem sempre posso.

Mas afinal não preciso de tudo para ser apenas eu.

Sabia lá! Que ser eu, é ser mais inteiro que ser tudo.